15 de março de 2017

Fátima: Que viram os pastorinhos?

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Uma senhora, vestida de branco, mais brilhante que o sol
Tinha um vestido branco, e um cordão de oiro ao pescoço até ao peito ... A cabeça estava coberta por um manto branco, também, muito branco, não sei, mas mais branco que o leite . . . e tapava-a até aos pés ... era todo bordado de oiro .... Aí que bonito! ... tinha as mãos juntas, assim, - e a pequena levantava-se do banquito, juntava as mãos à altura do peito a imitar a visão.
Jacinta

Jacinta, mais expansiva e sensível à beleza, não conseguia conter dentro de si a alegria sobrenatural que a inundava e não parava de exclamar: “Aí, que Senhora tão linda! Ai, que Senhora tão bonita!” Era alegria demasiado grande para permanecer num peito tão pequeno pelo que não tardou em dize-lo à sua mãe que se mostrou incrédula. Porém o seu pai, o Sr. Marto desde o primeiro momento acreditou, pois, conhecendo bem os seus filhos, sabia que nunca mentiriam amantes da verdade como eram.

Como podemos então conceptualizar as aparições, tanto as do anjo que se deram um ano antes a modo de preparação e as de Nossa Senhora de Maio a Outubro de 1917?

Aparição ou visão?
A teoria da autossugestão diz que, num ambiente em que as pessoas esperam que haja aparições haverá aparições. Não enquadram as aparições de Cristo ressuscitado aos apóstolos, nem a do mesmo a Paulo de Tarso, nem as aparições marianas aprovadas pela Igreja. Comum a todas estas é que a “aparição” apanha os videntes de surpresa.

Também não é uma visão, pois esta é sempre privada, e é expressão de uma forte experiência religiosa, sem público e sem uma mensagem para os outros",; por outro lado implica uma experiência religiosa anterior, frequentemente é um fenómeno místico que implica um longo processo de ascese.

Ao contrario da visão, a aparição é sempre profética, pois está confinada a um lugar e tempo específico, (Fátima Lourdes ou Guadalupe) há testemunhas desde o primeiro momento; há sempre uma mensagem profética para o tempo e para o lugar, e é sempre acompanhada de fenómenos, ou milagres que não têm uma explicação científica.

Foi, portanto, uma aparição a experiência dos pastorinhos em Fátima, mas foi esta como a de Cristo ressuscitado aos apóstolos? Partimos do principio de que a humanidade transfigurada de Jesus Cristo, o Seu corpo glorioso após a sua ressurreição e ascensão ao céu nunca mais se manifestou diretamente na terra na sua realidade corpórea como O viram os apóstolos. O mesmo pode ser dito em relação a Maria Sua mãe. Assim sendo os pastorinhos não tiveram uma visão de Maria na sua realidade corpórea, mas sim uma visão imaginativa, uma fantasia, uma alucinação. Jacinta de facto, num dos interrogatórios, referiu que a Senhora tinha pouco mais que um metro de altura.

Recordamos o princípio tomista: Quidquid recipitur ad modum recipientes recipitur. Para explicar o facto de que na ultima aparição enquanto a multidão estava entretida com o milagre do sol, os pastorinhos viram parte da corte celestial imaginada a seu modo: assim viram São José com o menino Jesus nos braços, a Nossa Senhora das Dores, Jesus Cristo abençoando o mundo e, por fim, a Nossa Senhora do Carmo.

Rejeitamos a presunção mesquinha de que tudo o que não é natural ou “normal” é patológico; os génios não são normais e, no entanto, não são patológicos. A Igreja, antes de permitir ou apoiar quaisquer aparições observa os seguintes critérios: 1. A mensagem está de acordo com o Evangelho e a doutrina da Igreja; 2. Os videntes gozam de perfeita saúde física e mental; 3. Os videntes são honestos e humildes e a sua vida é exemplar do ponto de vista espiritual e moral.

Alucinação divina
Assim qualificamos a experiência dos pastorinhos de Fátima. Alucinação, porque a Nossa Senhora não apareceu real e objetivamente; se assim tivesse sido, todos os presentes a teriam visto; divina, porque não foi provocada pela mente hipoteticamente doentia dos pastorinhos, porque eram perfeitamente sãos mentalmente, mas sim por Deus, para por intermédio deles, fazer passar uma mensagem para Portugal e o mundo inteiro.

A alucinação é uma perceção que ocorre na ausência física ou corpórea do objeto percebido; à semelhança do que ocorre com os sonhos noturnos, cuja sensação de realidade é tão viva que só ao despertar nos damos conta de que não era real. Portanto, no caso dos videntes de Fátima eles aperceberam-se da presença de Nossa Senhora sem ela estar realmente ou corporeamente presente.

Que há então de sobrenatural nesta experiência? O sobrenatural está no facto de que não foram os pastorinhos que se autoinduziram a esta experiência, mas sim foi causada por Deus. Este é de facto o critério principal para a sua autenticidade. Os pastorinhos não causaram a experiência, não a buscaram e nada fizeram para a ter é aqui que se situa o âmbito da intervenção divina assim como depois no conteúdo da mensagem que de modo nenhum podia ter sido por eles inventada, dada a sua condição de rudes e ignorantes, como os define o Cónego Manuel Formigão.

Não digo que seja a última palavra sobre o assunto; o que me faz ter a certeza de que as crianças experimentaram algo sobrenatural, é que, em conformidade com todas as pessoas que tiveram este tipo de experiências, as suas vidas mudaram radical e dramaticamente. Os videntes não só tiveram uma aparição e ouviram uma mensagem, eles encarnaram e viveram essa mensagem o resto das suas vidas.

A visão do inferno
Quidquid recipitur ad modum recipientes recipitur. Sto. Tomás de Aquino
O que é recebido, é recebido segundo a capacidade do recebedor. Este princípio tomista ajuda-nos a entender e conceptualizar as visões e no caso de Fátima é fundamental para a explicação da visão do inferno.  Quando a Nossa Senhora lhes mostrou o inferno não lhes podia mostrar a realidade verdadeira do inferno tal qual ele é. Seria como colocar o mar dentro de um buraco na areia, parafraseando o conto de Sto. Agostinho na compreensão do mistério da Santíssima Trindade.

O que os pastorinhos viram foi a recriação, na sua mente de todas as pregações que até ali tinham ouvido dos padres que, naquele tempo não se cansavam de amedrontar as pessoas com o fogo do inferno; também as representações gráficas em pagelas e nas “alminhas” que ainda hoje abundam à beira dos nossos caminhos.

Mais uma vez que há de revelação divina nesta experiência? De certo não a forma como as crianças viram o inferno, mas a ocorrência da visão, provocada pela Senhora.  Portanto, a experiência em si, foi provocada pela Nossa Senhora, a forma como essa experiência foi vivenciada pelas crianças tem que ver com a capacidade de compreensão destas e com a forma com que elas imaginavam o inferno com a ajuda da catequese e pregações. Parafraseando o principio tomista, o que as crianças viram, viram-no segundo os arquétipos e as imagens da sua mundividência.

O milagre do sol
Depois de tanto sofrer pela incredulidade e pelas pressões da sua mãe e pároco para que desmentisse as aparições, na aparição de 13 de Julho, Lúcia pediu à Senhora que fizesse um milagre “para que todos acreditem que Vossemecê nos aparece”. A Senhora prometeu que o faria e renovou a promessa a 19 de agosto e a 13 de setembro. E foi assim que uma grande multidão de pessoas se reuniu na Cova da Iria a 13 de outubro:

E, precisamente na hora vaticinada em julho - às 12h; -, algo de espantoso começa. Inesperadamente - porque uma chuva torrencial enchera de lama a Cova da Iria -, a Lúcia diz à multidão para as pessoas fecharem os guarda-chuvas (…) (nisto) o sol tremeu, o sol teve nunca vistos movimentos bruscos, fora de todas as leis cósmicas, - o sol bailou, segundo a típica expressão dos camponeses…

«Era como um globo de neve a rodar sobre si mesmo» (Padre Lourenço)

«Este disco tinha a vertigem do movimento. Não era a cintilação de um astro em plena vida. Girava sobre si mesmo numa velocidade arrebatada.» (Dr. Almeida Garrett)

«A certa altura, o sol parou e depois começou a dançar, a bailar; parou outra vez e outra vez começou a dançar» (Ti Marto)

«Uma luz, cujas cores mudaram dum momento para o outro, refletiu-se nas pessoas e nas coisas» (Dr. Pereira Gens – que o viu a 40 Km de Fátima)
Jornal O Século (diário liberal, anticlerical e maçónico de Lisboa)

Testemunhas são também as fotografias tiradas nesse dia nas quais se vê, primeiro como chovia torrencialmente e depois toda uma multidão olhando para o sol. Não seria possível haver tanta gente ao mesmo tempo a olhar para o mesmo lugar se aí não houvesse nada que captasse a sua atenção.

Mais uma vez repetimos algo aconteceu, não nada, e desta vez algo que tinha sido anunciado três meses antes e que acontece no dia e na hora indicada. O fenómeno foi testemunhado desta vez não só por pobre analfabetos e rudes e toscos ignorantes, mas também por professores padres médicos e catedráticos de universidade. Que aconteceu então?

De todas as explicações para este fenómeno a que nos parece mais plausível é a do físico e monge beneditino Stanley Jaki (1924-2009) professor onde Einstein também o foi em Princeton, New Jersey, que se deu ao trabalho de vir a Portugal para inquirir alguns dos que presenciaram o fenómeno (1924-2009). Isto foi o que concluiu:

Trata-se de um raríssimo fenómeno meteorológico, resultante da convergência e interação entre nuvens do tipo cirro (a altas altitudes, constituídas por cristais de gelo), com nuvens de baixa altitude (feitas de partículas de água em estado líquido), em interação com ventos que faziam rodopiar as partículas de água e gelo numa roda espiralada, que por sua vez gerou em simultâneo um feixe de cores cintilantes (resultantes da refração dos raios solares nas partículas de água e gelo) e um raro efeito de “lente”, que explica a estupefação das pessoas na Cova da Iria, que achavam que o Sol, aparentando aumentar de tamanho, se iria precipitar sobre elas.. Stanley L. Jaki, God and the sun at Fatima, Real View Books, 1999.

Se não foi um fenómeno astronómico, se o sol não dançou nem as leis da física foram violadas, mas apenas se tratou de um fenómeno meteorológico raro, mas possível, onde está então o milagre? O milagre está no facto de ter sido previsto pelos pastorinhos, 5 meses antes, e de ter sido indicado por Lúcia, o dia e o exatíssimo momento em que iria acontecer assim como aconteceu.
Pe. Jorge Amaro, IMC

1 de março de 2017

Fátima: Como se "impôs" à Igreja?

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Na Celebração do cinquentenário das aparições, a 13 de maio
de 1967, depois da missa o povo gritou ao papa Paulo VI que 
queria ver a Lúcia…
«Não foi a igreja que impôs Fátima, foi Fátima que se impôs à Igreja» Cardeal Cerejeira, em 1943

A Igreja não declara nem nunca declararia Fátima com a infalibilidade de um dogma. O que ali aconteceu ocorreu num âmbito intermédio entre o natural e o sobrenatural, portanto, como tudo em matéria de fé, não pode ser demonstrado de uma forma plenamente convincente ao pensamento racional, como também não pode ser demonstrado o contrário. A Igreja limita-se a declarar que o que aconteceu pode ser aceite com uma certeza razoável, e plausível; como aliás sempre acontece em matéria de fé. A fé nunca pode ser racional ou racionalizada, só pode ser e sempre tem de ser razoável.

Fátima fez um caminho longo e árduo até ser aceite pelas autoridades eclesiásticas e tolerada pelas autoridades civis. Um caminho onde certamente mais que uma vez interveio Deus para que não fosse ignorada. Sim Deus, pois os três pastorinhos não fazem apologia do seu testemunho e de alguma forma, pelo que se desprende dos interrogatórios aos quais foram submetidas, pouco lhes importa que acreditem ou não na sua palavra

Voz do povo voz de Deus
O povo continuava a afluir a Fátima às centenas de milhar: mesmo depois da morte de Francisco em 1919 e de Jacinta em 1920; apesar de ser ridicularizado nos jornais laicos, obstaculizados pelas autoridades civis, a ponto de dinamitarem a capela que ali tinha sido construída; em suma desde que Jacinta contou à sua mãe, as multidões juntavam-se às centenas de milhar.

Porque Jacinta não foi capaz de manter a aparição de 13 de maio em segredo nas restantes aparições, nos dias 13 de cada mês até à última no dia 13 de outubro, as crianças nunca mais estiveram sozinhas. No dia 13 de junho, estavam com elas cinquenta pessoas; em 13 de julho, de duas a três mil; no dia 13 de agosto, apesar dos videntes terem sido postos na prisão, 18.000 reuniram-se no lugar das aparições; nesse mesmo mês, os videntes viram a Senhora no dia 19, nos Valinhos, depois de serem libertadas da prisão. No dia 13 de setembro, era já uma multidão de 30.000 pessoas e no último, a 13 de outubro, cerca de 70.000 presenciaram o bem anunciado e esperado milagre, como a senhora tinha prometido a Lúcia três meses antes, no dia 13 de julho.

Não era só a fé que levava as pessoas a acorrerem em massa à Cova da Iria desde a segunda aparição, mas a participação na mesma aparição que começava sempre pelo rezar do terço liderado pela Lúcia. é certo que só os videntes viam a Nossa Senhora e entre eles, só a Lúcia falava com ela, mas o resto do povo também experimentava algo...

Todos são unânimes em dizer que ao meio dia solar de cada dia 13, incluído o 13 de Agosto em que as crianças estavam ausentes por terem sido detidas pelas autoridades, a luz do sol diminuía de intensidade, corria um ar fresco e uma pequena nuvem descia sobre a azinheira onde os pastorinhos diziam que a Nossa Senhora se pousava.

No decorrer das aparições viam a Lúcia em êxtase e ouviam-na a falar; em resposta às suas perguntas ouviam como um “zumbido de abelhas”. A Lúcia avisava sempre quando a visão terminava dizia que a Nossa Senhora se estava retirando para o Oriente desde onde sempre surgia.

Um dia a Jacinta cortou um raminho da azinheira onde a Nossa Senhora tinha pousado o Seu pé e todos os que o cheiraram deliciaram-se com um perfume desconhecido. Por fim o milagre do sol selou para o povo a autenticidade de Fátima que, desde então, é visitada às centenas de milhar e até milhões.

“Voz do povo voz de Deus”. - Quem defendeu e promoveu Fátima, impondo-a à Igreja perplexa e prevalecendo sobre as investidas insidiosas do republicanismo ateu, anticlerical e maçon, foi o povo simples, que ali começou a afluir aos milhares logo após a primeira aparição. Sem este, Fátima teria sido ignorada e esquecida. Uma vez mais se verifica o paradigma da Bíblia:  os ignorantes confundem os sábios. Mateus 11, 25

Aqueles que afirmam gratuitamente que foi a Igreja que criou Fátima, ignoram a documentação histórica que prova precisamente o contrário. Fátima só foi aprovada em 1930 depois de 13 longos anos de investigação. A relutância inicial da Igreja, em relação a Fátima é notória no testemunho do Pe. Lacerda diretor de um Jornal da época “O Mensageiro”, acerca do pároco de Fátima, em que afirma:

Como ultima nota elucidativa devo dizer que o pároco da Fátima, o meu amigo Pe. Manuel Marques Ferreira, se conservou sempre alheio a tudo, levando o seu proceder a nunca ter ido á Cova da Iria no dia das aparições. Só a muitos rogos lá foi no ultimo dia”.

Ainda acerca do pároco de Fátima, o Sr. Marto, o pai de Francisco e de Jacinta, e, ao contrário da mãe de Lúcia, o primeiro em acreditar na palavra dos seus filhos, refere que o Sr. Prior não acreditava e não deixava a gente acreditar. A incredulidade do pároco, explica e influencia a relutância da Sra. Maria Rosa, mãe da Lúcia, a admitir, quase até ao fim da vida, a graça que a Virgem concedeu à filha, amargando a vida desta.

Foi o povo que acorria à Cova da Iria aos milhares que manteve a chama de Fátima bem viva para obrigar as autoridades civis a respeita-la e as eclesiásticas a tomar uma posição favorável. O que aconteceu precisamente no dia 13 de maio de 1922, o dia em que D. José Alves Correia da Silva, bispo de Leiria, publica a “Provisão sobre os acontecimentos da Fátima”.

Nela resume os acontecimentos ocorridos em Fátima nos últimos anos, salientando precisamente a enorme adesão popular, apesar das perseguições das autoridades civis e do alheamento das autoridades religiosas, e nomeia uma Comissão, para estudar os acontecimentos extraordinários segundo as leis canónicas.

Apela, ainda, aos fiéis da sua e outras dioceses que “dêem conta de tudo quanto souberem quer a favor quer contra as aparições ou factos extraordinários que lhes digam respeito, e testifiquem especialmente se nelas houve ou há qualquer exploração, superstição, doutrinas ou cousas deprimentes para a nossa Santa Religião”. 

Como foram encaradas as aparições pelas autoridades
Não é verosímil que três crianças de tão tenra idade, (…) rudes e ignorantes, mintam e persistam na mentira durante tantos meses, posto que sejam obsidiadas com perguntas e interrogatórios (…) e ameaçadas pelo representante da autoridade eclesiástica e civil (…) Nenhum temor é capaz de demovê-las de afirmar que vêem Nossa Senhora (…) A naturalidade e franqueza com que se expressam, a simplicidade e candura com que se manifestam, a indiferença e desinteresse que mostram quanto ao facto de se lhes prestar ou não crédito. – Documentação critica de Fátima

Esta é a conclusão a que chega o Cónego Manuel Nunes Formigão, depois de inúmeros interrogatórios levados a cabo por ele, pelo Pároco de Aljustrel e Fátima, o Pe. Manuel Marques Ferreira, e outros clérigos. Todos eles muito críticos e até sarcásticos, mas nunca fizeram mal às crianças embora às vezes os interrogatórios levavam-nas à exaustão, especialmente no dia do milagre do sol, depois deste ter ocorrido.

Menos condescendentes, foram as autoridades civis quando chegaram ao extremo de as submeter à tortura psicológica.  Anunciaram aos pequenos que no quarto ao lado os aguardava uma caldeira de azeite a ferver-se não se retratassem. A primeira a ser interrogada foi a Jacinta, seguida do Francisco e da Lúcia. Um a um, os três entraram na câmara aterradora na certeza de que seriam fritos em azeite; o Francisco pensando que a sua querida irmã já estava morta, a Lúcia pensando que os seus queridos amigos e primos já estavam no Céu, como a Senhora tinha prometido que cedo os levaria.

A esta tortura há que juntar a pressão constante do povo; uns que ameaçavam outros que ridiculizavam outros ainda que lhes prometiam mundos e fundos se lhes revelassem o segredo. Era impossível que as crianças aguentassem tanto se não houvesse nada e que o que acontecia todos os meses no meio de tanta gente fosse apenas teatro. Abalados por todas as ameaças, os pais da Jacinta pensaram afastar as crianças de Fátima. Mas estes recusaram dizendo: ‟Se nos matam, não faz mal! Iremos mais rapidamente para o céu!”

Para o dia 13 de outubro esperavam-se grandes multidões, pois a Lúcia desde a aparição do dia 13 de julho disse que a Senhora ia fazer um milagre que para que todos acreditassem. Um dia antes, a pressão e a tensão era tanta nas famílias dos videntes que logo de manhã, a mãe da Lúcia sugeriu à filha que se fossem confessar pois iam-nos matar a todos se o milagre não se realizasse. 

Calmamente e cheia de convicção, a Lúcia consolou a mãe dizendo-lhe que se podiam ir confessar, se a mãe se quisesse, mas ela tinha certeza que a Senhora iria realizar o milagre pois não só tinha prometido como tinha renovado, a promessa nas aparições de agosto e setembro.

Sozinhas contra tudo e contra todos só a divina providência lhes valeu, pois também os seus familiares mais chegados, especialmente os de Lúcia, contribuíam para o seu sofrimento ao considerá-las mentirosas.

Estavam certamente dispostas a pagar com a suas vidas o testemunho que deram, porque não só proclamaram a mensagem da Nossa Senhora como elas mesmas a encarnaram nas suas vidas.  (… vão deitar-vos as mãos e perseguir-vos, (…) metendo-vos nas prisões; (…) assim, tereis ocasião de dar testemunho. (…) não vos deveis preocupar com a vossa defesa, porque Eu próprio vos darei palavras de sabedoria, a que não poderão resistir ou contradizer os vossos adversários (Lucas 21, 12-19).

Os que dizem que Fátima foi inventada pela Igreja, não têm documentos para comprovar as suas calúnias e não leram de certo a documentação crítica de Fátima que descreve:

Por um lado, os estratagemas seguidos pela autoridade civil, para desacreditar e calar as crianças e impedi-las a elas e ao povo de acorrer ao lugar da Cova da Iria. Por outro o processo rigoroso que foi seguido pela autoridade eclesiástica, que para além dos interrogatórios do pároco e do Cónego, constou de uma comissão que instaurou um inquérito canónico oficial para averiguar a veracidade das aparições. Finalmente, a 13 de outubro de 1930, 13 anos depois, com o conhecimento e aprovação do Papa Pio XI, o Bispo D. José Correia da Silva anunciou os resultados do inquérito numa carta pastoral:

(…) invocando humildemente o Espírito Divino e colocando-nos sob a proteção da Santíssima Virgem, e depois de ouvida a opinião dos nossos Reverendos Conselheiros, declaramos dignas de crédito as visões dos pastorinhos na Cova da Iria, freguesia de Fátima, desta diocese, de 13 de maio a 13 de outubro de 1917. Permitimos oficialmente o culto de Nossa Senhora de Fátima.

Fátima e os papas
A 5 de Maio de 1917, quando a 1º Grande Guerra ainda estava no seu apogeu, o Papa Bento XV, em carta dirigida ao Secretário de Estado Cardeal Gasparri, rogou com veemência o auxílio do Céu, por meio da Mãe de Deus:

“Encarregamos portanto a Vós, Senhor Cardeal, de fazer conhecer a todos os bispos do mundo o nosso ardente desejo que se recorra ao Coração de Jesus, Trono de graças, por meio de Maria (…) a piedosa e devota invocação e leve a Ela o angustioso grito das mães e esposas, o gemido dos meninos inocentes, o suspiro de todos os nobres corações; possa mover a Sua amável e muito benigna solicitude a obter para o mundo desvairado a aspirada paz, e possa lembrar depois aos séculos futuros a eficácia de Sua intercessão e a grandeza do benefício por Ela obtido a Seus filhos”.

Oito dias depois Nossa Senhora apareceu em Fátima, anunciando ao Papa e ao mundo o seu plano de paz. Um ano mais tarde o mesmo Papa, em carta dirigida aos bispos portugueses para restabelecer a diocese de Leiria, referiu-se às ocorrências de Fátima como "uma ajuda extraordinária da Mãe de Deus."

Pio XI, sucessor de Bento XV, ofereceu pessoalmente estampas da imagem de Nossa Senhora de Fátima a seminaristas.  Pio XII referiu-se a Fátima pela primeira vez em 1940, na encíclica Saeculo exeunte.   Em 1950 o Papa Pio XII disse mesmo ao Superior Geral dos Dominicanos: "Dizei aos vossos religiosos que o pensamento do Papa está contido na Mensagem da Fátima."

Em 1964, no fim do Concílio Vaticano II, o Papa Paulo VI ofereceu a Rosa de Ouro a Fátima, e encomendou toda a Igreja ao cuidado de Nossa Senhora de Fátima, ele mesmo visitou Fátima no quinquagésimo aniversário da primeira aparição. O Papa João Paulo II visitou Fátima três vezes – em 1982, 1991 e 2000. Na sua visita do ano 2000, beatificou os dois videntes falecidos, Jacinta e Francisco. Também fez universal a Festa de Nossa Senhora de Fátima, ordenando a sua inclusão no Missal Romano. Por fim o Papa Francisco pediu ao Patriarca de Lisboa que consagrasse o seu pontificado à virgem de Fátima, o que ocorreu a 13 de maio de 2013.
Pe. Jorge Amaro, IMC