1 de julho de 2016

O Sol põe-se no Ocidente - 1ª Parte

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As civilizações morrem por suicídio não por homicídio. Arnold Joseph Toynbee

França laboratório social
A revolução francesa é um de tantos exemplos de como França, talvez pela sua situação geográfica, tenha sido e continue a ser o tubo de ensaio de ideias sociais que depois revolucionam o resto da Europa e eventualmente o resto do mundo ocidental.

Será por esta razão que precisamente aquela que travou a invasão islâmica da Europa, em Poitiers no ano 732 AD, está agora a sofrer um novo tipo de luta e invasão? O facto é que, em pouco tempo foi duas vezes vítima do terrorismo islâmico: em fevereiro de 2015, contra o jornal satírico Charlie Hebdo, e em novembro do mesmo ano, em Paris nas aforas de um estádio de futebol, em alguns bares da cidade e sobretudo no teatro Bataclan onde decorria um concerto de rock.

Com vistas a uma maior integração politica entre os países membros da Comunidade Europeia, o ex-presidente Francês Valéry Giscard d'Estaing, redactou a Constituição da Comunidade Europeia. Aprovada pela Comissão, estava fadada para passar em todos os parlamentos europeus de não ter sido chumbada por um referêndum francês. Depois deste chumbo a Europa nunca mais levantou a cabeça, e vive hoje mergulhada numa crise de identidade e desintegração progressiva.

Há muito que campeia neste país um descarado e obsceno laicismo militante, inspirador das caricaturas grotescas da revista Charlie Hebdo contra a fé cristã e muçulmana, nunca contra a fé ateia. Por serem de sobra conhecidas as caricaturas do islão menciono duas contra o cristianismo particularmente chocantes e blasfemas: uma representa a Santíssima Trindade num “ménage a trois” sexual, a outra, representa o Papa Francisco a ser sodomizado por um travesti.

Apesar do laicismo e niilismo militante contra a religião, a França ainda é maioritariamente católica, como se declara 63% da sua população. Outrora a “filha amada da Igreja”, onde está hoje essa França que tanto defendeu o cristianismo, e que tantos santos e teólogos deu à Igreja e ao mundo? Agora cabisbaixa perdeu toda a assertividade de outrora e deixa-se vexar por gente sem princípios, como se tivesse vergonha de ser cristã. Tendo sido no passado o país que travou o avanço dos muçulmanos, em Poitiers no ano 732, hoje é o país da Europa que mais muçulmanos tem: 7.5% da população, seguida pela Alemanha 5,8%, a Inglaterra com 4,8%, a Espanha com 2,1 % e Portugal com 0,3%.

Pode a história repetir-se?
Se a história se repete, e o inesperado sempre acontece, quão incapaz é o homem para aprender com a experiência!? ― George Bernard Shaw

A história não é feita só de evolução e progresso, mas também de desenvolução e regressão. Desde o Egipto dos faraós, a Mesopotâmia, Israel, Grécia, até Roma, cada país, cada Imperio deu o seu contributo à civilização ocidental que se foi desenvolvendo progressivamente até chegar ao seu apogeu, económico, politico e cultural, com Grécia e Roma.

Do Egipto herdamos a medicina, a astrologia, a origem da escrita alfabética; da Mesopotâmia-Babilonia herdamos o primeiro código de leis - o Código Hamurabi, e técnicas agrícolas; de Israel, herdamos o monoteísmo religioso como cosmovisão e a Bíblia como fonte de ética; da Grécia herdamos a filosofia, a ciência e a democracia como forma de governo da cidade; de Roma herdamos a República, a forma de organização do Estado, o direito, as estradas e as pontes.

Parece impossível que uma cultura superior, em todos os aspetos incluindo o militar, tenha sucumbido ante um punhado de bárbaros incultos vindos do Norte e do Leste da Europa que mergulharam o continente em séculos de trevas. Qual foi a causa da ruína do Império romano? Como pode uma cultura superior ser derrotada e sucumbir ante uma muito inferior?

Como diz o grande historiador britânico Arnold Toynbee, acima citado, as civilizações morrem por suicídio não por homicídio. Os bárbaros apenas pregaram “o último prego no caixão”; apenas deram o golpe de graça a uma civilização que há muito estava moribunda. O Império Romano acabou por implodir, caiu sobre a própria espada - suicidou-se.

Roma não se construiu num dia e também não ruiu numa noite, foi um processo gradual que começou pela degradação e o declínio moral dos valores cívicos que tinham construído o império. São as ideias, os valores morais e éticos que motivam a vida do dia a dia dos povos. Quando estes faltam, a vida das pessoas muda e com ela a sociedade. Portanto, o Império antes de ruir política económica e militarmente primeiro ruiu moral e eticamente.

Não podeis servir a Deus e o dinheiro (Mateus 6, 24) – No contexto do declínio de Roma, Deus simboliza os valores espirituais, autenticamente humanos, e o dinheiro os valores temporais. A degradação moral, como sempre, começou na acumulação de riqueza, na vida desregrada de prazer e luxo, das classes dirigentes; naqueles que deviam continuar a inspirar os antigos valores que levaram ao engrandecimento do Império no tempo de César Augusto.

Das classes dirigentes, como fogo que lentamente se propaga, a corrupção acabou por alastrar-se a todos os níveis da sociedade romana. O amor pelo poder levou à instabilidade política; as guerras constantes de sucessão obrigavam as legiões a abandonar as fronteiras para vir restabelecer a ordem e a disciplina na capital.  Por fim o crescente abismo, entre uns muito ricos e o resto muito pobre, fez do Império o gigante com pés de barro, vulnerabilidade que os bárbaros souberam explorar.

Muitos dos fatores que contribuíram para o declínio de Roma, depois de 500 anos de domínio absoluto sobre o Ocidente, estão em ação agora mesmo fazendo possível que a historia se possa repetir e que as hostes, desta vez as muçulmanas, possam fazer mergulhar o ocidente numa segunda idade média ou das trevas, como os historiadores americanos gostam de chamar.

Houve muito menos atrocidades no Césaro-papismo (Estado e Igreja unidos) da Idade Média que na Sharia dos países muçulmanos dos nossos dias: O bombardeamento pelos Taliban do Afeganistão das centenárias estátuas de Buda escavadas na rocha da montanha; o apedrejamento das mulheres adulteras; o corte de membros sobretudo as mãos daqueles que roubam; o sonho de Erdogan, presidente da Turquia, em restaurar o império Otomano; O jogo duplo da Arábia Saudita, pela frente amiga do Ocidente a quem vende petróleo por detrás financiando o terrorismo ou qualquer forma de militância islâmica; o sonho do Irão dos Ayatollalhs em erradicar Israel do mapa e em possuir a bomba atómica; as atrocidades do Estado Islâmico em degolar até crianças porque faltaram à oração na sexta feira…

A disfuncionalidade da família
Por ser a família a célula germinal do tecido social, os valores familiares são a pedra angular de uma cultura em ascendência; assim era na antiga Roma durante a sua expansão e na sociedade ocidental do pós-guerra até ãos anos 70. Com as novas gerações, a família começou a enfraquecer e fraturar-se.

Os valores verdadeiramente humanos e espirituais prosperam melhor numa sociedade frugal do que na abundância de bens materiais. O aumento do bem-estar material que a sociedade de consumo trouxe ao ocidente, é inversamente proporcional ao decréscimo na vivencia de valores espirituais e humanos. Pouco a pouco, com cada nova geração tal como aconteceu na sociedade romana, a unidade da família começou a fragmentar-se e a enfraquecer.

Tal como na antiga Roma, com o declínio dos valores morais, maridos e esposas cederam aos impulsos da natureza humana, generalizou-se o adultério, aumentou o número de casamentos fracassados e famílias disfuncionais; o divórcio apresenta-se como a solução mais fácil para qualquer tipo de conflito entres esposos. Atualmente a taxa de divórcio nos Estados Unidos é de 53%, em França de 55%, em Espanha de 61% e em Portugal de 70%.

Com famílias desestruturadas e disfuncionais abundam os pais negligentes, a quem o Estado se vê obrigado a retirar os filhos, pelo que há cada vez mais crianças e jovens institucionalizados. Na antiga Roma a educação das crianças e dos jovens era esmerada e cuidada de forma a que os valores do patriotismo, a formação do caracter, o controlo das emoções, a importância da obediência e o respeito pelas leis, fossem assimiladas; assim era na antiga Roma e nas décadas 60/70 no mundo ocidental.

Hoje em dia a escola não ensina valores, a única disciplina que os ensinava, Educação Moral e Religiosa Católica, despareceu da maior parte das escolas, e naquelas onde ainda existe, é relegada para segundo plano e colocada ao fim de uma tarde sem aulas, obrigando assim até os alunos mais fervorosos a desistir.

Um falso conceito de democracia e a sua inadequada aplicação na área da educação levou muitos pais a abdicar de serem educadores, ensinar, disciplinar e corrigir para estabelecerem uma relação de amizade de igual para igual com os seus filhos acabando por dar-lhes mais liberdade que aquela que eles na sua tenra idade eram capazes de gerir responsavelmente. Sem disciplina e guia os jovens crescem como pequenos burgueses com a vida facilitada e alcatifada, preguiçosos, irreverentes e desobedientes vivendo num mundo de fantasia onde só têm direitos e não têm deveres, onde só consomem sem contribuirem.

Com a perda do valor da família perdeu-se também a solidariedade entre as gerações, prova disso é o crescente isolamento e solidão em que vivem muitos dos nossos idosos. Quem não recorda aquela onda de calor, em agosto de 2003, em que só em Paris mais de 14.000 idosos morreram sozinhos nos seus apartamentos. Muitos dos seus corpos não foram reclamados por ninguém e tiveram funerais pagos pelo Estado. Nem os cães assim morrem hoje em dia… ironicamente, em Portugal, tal como está a lei, é crime abandonar um animal de estimação, mas não é crime abandonar um idoso.

Natalidade negativa
Recentemente um anúncio publicitário de preservativos mostrava um pai com o filho às compras num supermercado; passando por uma prateleira o filho agarrou num saco de batatas fritas e colocou-o dentro do carro, o pai retirou o saco do carro e voltou a colocar na prateleira; o filho reticente, repete a façanha e o pai também; à terceira vez a criança tem um ataque de histeria e começa a dar pontapés ao carro e às prateleiras esvaziando-as do seu conteúdo. Ante o assombro do pai e outros adultos a titulo de explicação do que está a acontecer aparece a mensagem do anuncio publicitário que diz: “Se tivesse usado o preservativo tal…. Isto não teria acontecido”.

Desta cena, qualquer pessoa com senso comum concluiria que a criança está muito mal-educada; o anúncio, no entanto, parece que quer que os telespectadores concluam que as crianças são o resultado do falhanço desta ou daquela marca de preservativo.

O crescente individualismo e egocentrismo influenciou a taxa de natalidade; alguns matrimónios equacionam a possibilidade de ter animais de estimação em vez de filhos. Muitos destes animais de estimação são tratados como membros da família, estabelecendo com eles laços próprios de seres humanos; autênticas fortunas são gastas no seu bem-estar.

Recordo o episódio de um gato ligado a uma máquina que lhe mantinha a vida artificialmente, quando o veterinário sugeriu desligar a máquina, porque os órgãos vitais já não funcionavam, foi chamado de cruel pela família a quem o animal de estimação pertencia.

A irracionalidade do aborto
Apesar de envelhecido e sem gente suficiente para substituir a geração anterior, o ocidente continua a olhar para o aborto como um método anti conceptivo. Sobre esta e outras questões, desde o caso de Galileo Galilei, a igreja tem sido injustamente acusada e estigmatizada como sendo pré-científica. No caso de Galileu, a verdade é que ele não forneceu provas que fundamentassem a sua teoria; provas essas que, por outro lado não estavam disponíveis naquele tempo. O mesmo aconteceu em relação à teoria de Einstein da relatividade que só agora começam a aparecer provas que a dão como certa.

A Igreja não só não é contra a ciência como faz ciência. Entre muitos exemplos ressalto o padre belga Georges Lamaitre que descobriu o Big Bang, e o monge Gregor Mendel tido como o pai fundador da genética.

No caso do aborto é a sociedade que se coloca contra a ciência, pois cientificamente é indiscutível que a vida humana começa com a concepção, ou seja quando o espermatozoide, que é metade de uma célula humana, se une ao óvulo, que é outra metade, aproximadamente uma hora depois do ato conjugal, formando uma célula humana nova, indivisível, com um código genético novo irrepetível em toda a história da vida neste planeta.

Uma vez formada a célula primigénia, o novo ser está auto programado, só precisa que o deixem em paz por nove meses. Quando para justificar o aborto certos partidos procuram colocar o princípio da vida humana em qualquer outro momento depois da concepção, fazem-no tendenciosamente para defender a sua ideologia; para além da concepção, qualquer outro momento em que coloquemos o princípio da vida humana não será nunca científico, mas sim arbitrário e ao serviço de uma ideologia.

Enquanto isto acontece no Ocidente Erdogan, o presidente da Turquia que sonha com a restauração do império Otomano como acima foi dito, declara-se contra o planeamento familiar, limitação dos nacimentos e a igualdade de género dizendo que são ideias ocidentais, não aplicáveis ao mundo muçulmano; para ele ninguém deve interferir nos desígnios de Alá; o dever de uma mulher é ser mãe, de quantos mais filhos melhor.

A função da profecia
Jonas levantou-se e foi a Nínive, segundo a ordem do Senhor. Nínive era uma cidade imensamente grande, e eram precisos três dias para a percorrer. Jonas entrou na cidade e andou um dia inteiro a apregoar: «Dentro de quarenta dias Nínive será destruída.» Jonas 3, 3-4

Na Bíblia a profecia nunca pretendeu ser um vaticínio, mas sim uma admoestação ou um aviso: se continuais a viver desta maneira vai acontecer esta ou aquela catástrofe. Os habitantes de Nínive como sabemos converteram-se e o que o profeta Jonas anunciou estar para vir não veio. O mesmo pode acontecer á civilização Ocidental, por meio de uma revolução ou evolução pode mudar de rumo evitando o declínio ao qual se dirige hoje.
Pe. Jorge Amaro, IMC