15 de janeiro de 2014

Entrevista ao Pe. Jorge Amaro, IMC

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Na passada quinta-feira, 12 de dezembro, recebemos aqui na WebRádio Vale do Tamel a presença do Sr. Padre Jorge Amaro. Este sacerdote missionário esteve na escola sede do Agrupamento a partilhar nas aulas de Educação Moral e Religiosa Católica as suas experiências vividas por esse mundo fora. Esta entrevista baseou-se, entre outros aspectos, na história de vida e nas aventuras que o Sr. Padre Jorge Amaro viveu enquanto missionário na Etiópia. Também ele nos recitou o "Pai Nosso" em etíope, o que foi bastante engraçado! Adorámos fazer esta entrevista, foi muito interessante conhecer melhor todos estes anos vividos por ele. Aqui fica a entrevista partilhada com o nosso auditório. | Ana Luísa e Maria Inês _ equipa WebRádio|
Entrevista ao Pe. Jorge Amaro by Geo Nauta

1 de janeiro de 2014

A vida em três tempos e em três actos

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O homem de hoje é fortemente influenciado pela espiritualidade do “presentismo”, vinda do extremo oriente, e pela filosofia de vida do consumismo, que apela mais aos nossos instintos básicos e menos à nossa razão, buscando desligar os nossos actos no presente, das suas causas no passado e das suas consequências no futuro. O objectivo é levar o homem a viver no pseudo eterno presente de um nirvana consumista.

Quando, na última etapa da nossa vida,  vivermos no verdadeiro eterno presente, o Céu, então o passado e o futuro deixarão de ser importantes; mas até lá, e enquanto vivermos limitados pelas coordenadas do espaço e do tempo, o passado e o futuro são de capital importância.

A vida é como uma peça de teatro em três tempos e em três actos. Quem vive no passado é um morto-vivo, porque o passado já não está operativo, não se pode actuar nele, está fechado, passou; “Águas passadas não movem moinhos”.

Quem vive no presente desintegrado e sem referência ao passado é um vivo-morto, pois não possuindo memória histórica, é uma cana agitada pelo vento, e como não sabe de onde vem não sabe quem é, não tem identidade; quem vive no presente desintegrado e sem referência ao futuro, sem um sonho, sem um projecto, não sabe para onde vai, e “para quem não sabe para onde vai não há ventos favoráveis”.

Quem vive só no futuro, perde muitas oportunidades no presente e esquece-se que esse futuro, para ser possível, tem de ter um pé no presente, ou seja há coisas no presente que devem ser feitas para preparar o projecto a ser completado no futuro; se o futuro é o telhado da casa, o presente são os alicerces e as paredes. Um futuro sem presente é uma utopia, uma fantasia; é viver no limbo num eterno “stand by”.

A vida humana resulta de um vivência equilibrada e harmónica dos três tempos, entre os quais decorre. Vivemos no presente e só no presente; mas ao olhar para o passado descobrimos quem somos e o sentido da nossa vida; e ao projectar-nos no futuro encontramos a motivação do nosso viver. O presente é só uma peça de um puzzle que na sua totalidade inclui o passado e o futuro.

  • O passado é a razão, o presente a nossa acção, o futuro a nossa motivação.
  • O passado é a tradição, o presente a acção, o futuro a inovação.
  • O passado é o que fomos, o presente o que somos, o futuro o que seremos.
  • O passado é o ser, o presente o existir, o futuro o transcender.
  • O passado é Deus Pai que nos criou por amor, o presente Deus filho que nos salvou e salva dando-nos saúde aqui e agora; e o futuro é Deus Espírito Santo que nos anima, inspira e dá força no nosso caminhar.
  • O passado é a fé, o futuro a esperança, e o presente a caridade.
A fé identifica-nos com um passado
O património da humanidade não é constituído só pelos monumentos históricos, mas por tudo o que a raça humana é e fez ao longo dos 5 milhões de anos da sua existência neste planeta. Tudo isto é geneticamente incorporado no ADN, de cada criança que vem a este mundo, é algo assim como o inconsciente colectivo de Jung, é parte de nós e define-nos como tal. Tudo isso é passado.

“Libris ex libris fiunt”, quando quero criar algo novo, em qualquer campo do saber, tenho que pesquisar sobre o que já foi feito naquela matéria, para assim agregar o fruto do meu trabalho. Só Deus tem a capacidade de criar do nada.

A fé num Deus pessoal, criador de tudo e de todos, que se revelou pelos profetas e depois no Seu Filho, que nos enviou o Espírito Santo, já tem uma história. A minha aderência a esta fé leva-me a fazer parte desta história, e dá-me identidade, e sentido de pertença a um povo e uma comunidade.

O mesmo sucede a nível individual; sei o que sou e do que sou capaz ao olhar para trás, e ver o desempenho dos meus talentos e dos meus defeitos nas diversas circunstancias que a vida me deparou ao longo da minha história pessoal. É a aprovação desse passado que me dá o sentido de autoestima, que preciso para me relacionar adequadamente comigo mesmo, com Deus, com os outros e como o meu entorno.

Até Deus que vive na eternidade, fora do espaço e devir do tempo, para se apresentar aos homens, fez-se valer da sua convivência com eles no passado, apresentando-se a Moisés como sendo o Deus de Abraão, de Isaac e de Jacob…

A esperança projecta-nos no futuro
Obstinado o burro, como não queria andar, o moço atou uma cenoura, na ponta de um cordel, que pendurou num pau, depois montou no burro e colocou a cenoura dois palmos à frente do focinho do burro. Na esperança de trincar a cenoura o burro lá ia andando, não se dando conta que a cenoura também se deslocava.

A esperança é a fé com rodas; a fé dinâmica que nos projecta no futuro. Todos precisamos de uma “cenoura” para caminhar. O sonho é o motor da vida; não está no presente o que inspira o nosso presente.

Martin Luther king foi um daqueles que, projectado no futuro, hipotecou a sua vida na luta pela igualdade entre brancos e pretos; um sonho que ele sabia que não se realizaria na sua vida. No dia anterior ao seu assassinato, inspirando-se em Moisés que depois de 40 anos a caminhar pelo deserto viu a Terra Prometida, na qual não entrou, desde o alto do Monte Nebo disse: Estou grato a Deus porque me concedeu ver a Terra Prometida, posso não entrar nela convosco mas estou certo de que nós, como povo, um dia entraremos nela.

Só se vive com sentido no presente se este está impregnado de futuro. Viver um presente sem a presença do futuro é andar à deriva. E quando o presente é doloroso, é a esperança num futuro melhor que nos ajuda a suporta-lo.

A caridade preenche o nosso presente
Ao contrário do passado e do futuro, o presente está nas nossas mãos, nele e só nele somos livres para actuar. O presente é o aqui e agora da nossa vida que devem ser cheios de acção, de actos de caridade e amor. Para o cristão viver é amar e amar é servir, colocar-se ao serviço dos que mais necessitam.

Pondo em proporção o que a Madre Teresa de Calcutá fazia, e o muito que havia para fazer ante tanta pobreza e miséria, um jornalista disse um dia, “O que a Madre faz é como uma gota de água no oceano”; ao que ela respondeu com muita humildade, “sim mas se o não fizesse o oceano teria uma gota de água menos”. 

Deus não nos pede que revolucionemos o mundo, ou que façamos o melhor, só nos pede o nosso melhor. Na parábola dos talentos, o que conseguiu mais não é mais louvado que o que conseguiu menos; na parábola dos trabalhadores da vinha, os que trabalharam o dia inteiro não receberam mais do que os que trabalharam só uma hora; na parábola do semeador, os que produzem 100% não são mais exaltados que os que produzem 60% ou os que só produzem 30%.

Muito ou pouco, tudo o que o Senhor nos pede é que demos fruto. Que a nossa vida seja produtiva; que deixemos cá mais do que o que cá encontramos. Que sejamos parte da solução e não parte do problema; ou seja que o nosso viver e actuar seja um contributo para a solução dos problemas deste mundo e não um contributo para os agravar.

Três virtudes três Papas
Há quem queira ver uma encarnação das virtudes teologais na vida dos três últimos papas da Igreja. João Paulo II, o que transpôs o umbral do terceiro Milénio, é o papa da Esperança; Bento XVI, que escreveu uma encíclica sobre a fé, proclamou o ano da fé e toda a usa vida como teólogo se debateu pela razoabilidade da fé, é por consequência o papa da Fé; O Papa Francisco, pelo nome que escolheu pelas suas palavras e gestos, o papa da caridade.
Pe. Jorge Amaro, IMC