16 de novembro de 2013

Missão até aos confins do Tempo

Sem comentários:

Ide, pois, fazei discípulos de todos os povos, (…) E sabei que Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos.» Mateus 28, 19-20

(…) Quando o Filho do Homem voltar, encontrará a fé sobre a terra? Lucas 18, 8b

O mandato missionário de Cristo dá-se quando Ele, antes de subir ao céu, deu por cumprida a Sua Missão como enviado do Pai. Assim começou a Missão “Ad Gentes”, ou a missão do espaço, pois Cristo mandou os seus discípulos por todo o mundo.

Mas como seres espácio-temporais que somos, a Missão tem também uma dimensão temporal e histórica, “Intra Gentes”, que consiste em passar o evangelho de geração em geração até aos confins dos tempos. Em suma: Missão Ad Gentes” até aos confins do Mundo, Missão “Intra Gentes” até aos confins dos Tempos.

Recapitulação do dito anteriormente
O testemunho de cristãos autênticos suscita a fé dos que o presenciam; os que ousam fazer a opção da fé chegarão, pela experiência de Deus, à plena convicção de que não acreditaram em vão; esta experiência, ou seja o encontro pessoal com Cristo e o estabelecimento de uma relação amorosa e íntima com Ele, leva à salvação, por outras palavras, à saúde da alma e do corpo, à conversão, à mudança de vida.

Por fim, este novo cristão começa ele mesmo a ser testemunho da salvação que Deus actuou na sua vida, podendo também ele suscitar a fé em quantos entram em contacto como ele. É neste sentido que nós, os missionários, sempre insistimos que todo cristão autentico ou é missionário, ou não é cristão. Começámos pelo testemunho, e regressamos ao testemunho como principio do processo que leva - à opção da fé - à experiência de Deus  - à mudança de vida, e  - à missão que não é outra coisa que entoar como Maria, o nosso Magnificat pessoal ou seja, dar testemunho das maravilhas que o Senhor operou em mim.

Missão “Intra Gentes”
Quando desde Jerusalém os discípulos começaram a pôr em prática o mandato que receberam do Senhor, foram surgindo convertidos por toda a parte. Esses novos cristãos eram convidados a agruparem-se em pequenas comunidades. São Paulo foi o fundador de muitas delas, a dos Coríntios, a de Éfeso, Tessalonica etc.

Enquanto São Paulo e os outros apóstolos continuavam a sua faina de “pescadores de homens”, nome que o próprio Senhor tinha dado aos seus apóstolos, alguém tinha que cuidar dessas pequenas comunidades recém constituídas. Nasceram assim os primeiros pastores cuidadores do rebanho das ovelhas do Senhor. Tito, Timóteo e Filémon, são alguns desses colaboradores a quem o Apostolo, confia as comunidades por ele constituídas. 

Portanto já nos tempos apostólicos como consequência lógica da missão “Ad Gentes” – a de levar o evangelho a todo o mundo – nasceu a missão “intra gentes” ou seja a que decorre no seio de um povo e que consta de fazer passar o evangelho de geração em geração até aos confins dos tempos. Podemos concluir então que a Missão “Ad Gentes” é a missão dos pescadores enquanto que a missão “Intra Gentes” é a missão dos pastores.

A missão “intra gentes”, como todo Estado Social, assenta no valor ético da solidariedade entre gerações: os que agora trabalham descontam uma percentagem do seu salário para que os seus pais, a geração anterior, possam usufruir de uma pensão de reforma. No Estado social a solidariedade é para com a geração anterior; na missão “Intra Gentes” é para com a geração posterior. Como toda educação também a cristã é aérea, quando os pais vivem o seu cristianismo autenticamente, suscitam a fé e a mesma vivência nos seus filhos.

Com tudo o que tem feito pelo progresso espiritual e material dos povos, a missão Ad Gentes foi por alguns chamada “a cara lavada da Igreja”. Assolada por escândalos e desistências a missão “Intra Gentes” parece ter uma cara menos apresentável. O evangelho parece estar a progredir na vanguarda e regredir na retaguarda.

No mundo ocidental, durante a idade antiga e média, passar o evangelho de geração em geração, foi tarefa relativamente fácil; desde o Renascimento o redil tem vindo a perder ovelhas; a tentativa do Vaticano II, em adaptar a Igreja ao mundo moderno, não inverteu esta tendência; hoje o problema é alarmante. Prova disto é a preocupação constante dos papas, desde Paulo VI que proclamou o primeiro ano da fé; João Paulo II, que lançou a nova Evangelização, e Bento XVI, que proclama pela segunda vez na Igreja um ano da fé.

“A fé ou se apega ou se apaga”
Não rogo só por eles, mas também por aqueles que hão-de crer em mim, por meio da sua palavra, João 17, 20. Na sua oração sacerdotal Cristo pensou em todos os que, de geração em geração iriam receber a Boa Nova. A nossa fé em Cristo é apostólica porque desde os apóstolos tem vindo a passar de geração em geração, como o testemunho na corrida de estafetas passa de atleta para atleta.

Eu estarei sempre convosco até ao fim dos tempos. Podemos dar por descontado que Cristo estará sempre connosco mas estaremos nós sempre com ele?

Quando o Filho do Homem voltar, encontrará a fé sobre a terra? É um enigma e uma possibilidade; os pais, os catequistas, os professores, os pastores e educadores em geral não estão a conseguir passar a fé para as gerações vindouras, que são cada vez mais descrentes. Uma fé enfraquecida de geração em geração pode acabar por desaparecer da história da humanidade, sendo possível que quando Cristo vier pela segunda vez, para julgar os vivos e os mortos, não encontre fé na terra.

Quando o sinal de rádio ou TV chega fraco a um sítio é preciso erguer uma torre de antena para fortalecer o sinal. Como alguém disse, “A fé ou se apega ou se apaga”. A passagem de Cristo, de geração em geração, tem a equivalência da ressurreição de Cristo para essa geração e para as gerações seguintes; a não passagem equivale à sua morte tanto para a geração presente como para as futuras.

Cristo vai ressuscitando, de uma geração para a seguinte, ou morrendo de geração em geração. Se a tendência actual continua, um dia, a morte histórica de Cristo pode transformar-se na morte de Cristo na História. Para não seremos parte do problema, sejamos parte da solução; ou seja, nesta corrida de estafetas, ou corrente de transmissão da fé, não sejamos nós, o elo mais fraco. Estamos sempre em tempo de Missão pois ela só termina quando Cristo for tudo em todos. 1ª Coríntios 15,28
Pe. Jorge Amaro, IMC

1 de novembro de 2013

Missão até aos confins do Mundo

Sem comentários:

Ide pelo mundo inteiro, proclamai o Evangelho a toda a criatura. Marcos 16, 15

Cristo não veio ao mundo para salvar só os que viveram no seu país, durante os 33 anos da sua vida terrestre. Era consciente de ser, na Sua pessoa, a salvação da humanidade, tanto para os que viviam durante a Sua existência no mundo, como para os que viveram antes Dele, assim como para os que viveriam depois Dele.

Tal como a pedra, que lançada no meio de um lago, provoca ondas em forma de círculos concêntricos, que desde o centro se vão alargando em direcção à periferia até aos confins do lago, assim Cristo surgindo no meio da história da humanidade, estende a sua acção salvífica até aos confins da Terra e aos confins do tempo.

A Igreja é Cristo aqui e agora
Como somos seres espácio-temporais, ou seja, ocupamos um espaço durante um tempo, Cristo fundou a Igreja para que continuasse a sua Missão em todo o tempo e em todo o lugar. A Igreja, como corpo místico de Cristo, representa Cristo em todos os “aquis” e “agoras” da história da humanidade. 

Todo cristão é missionário, como toda a semente tem a vocação de ser fruto, como todo homem a vocação de ser pai, e toda a mulher de ser mãe. Um copo só prova que está cheio quando derrama algum do líquido que contém; “A boca fala da abundancia do coração”, um cristão por inteiro não pode não anunciar por obras e por palavras o que o anima. A vizinha que se sentiu curada por este chá, ou aquela mezinha, não pára de exortar as suas companheiras para que experimentem também elas.

Tudo na vida, incluindo a vida em si mesma, é um dom. Os dons, só se têm quando se dão e perdem-se quando não se partilham e exercitam. Como o dom de cantar, o dom de pintar, de escrever, jogar futebol aumentam quando exercitados e partilhados, assim o dom da fé. Aquele que não exercita os seus dons, como sugere a parábola dos talentos, perde o pouco que tem.

Pela Missão “Ad Gentes” a Igreja está chamada a sair de si mesma, a deixar a zona de conforto de passivamente pastorear as 99 e partir, como pescador ou caçador, em busca da ovelha perdida, enfrentando os perigos e os riscos de ir como cordeiro para um mundo de lobos.

Motivam e inspiram os missionários, de todos os tempos, o zelo do grande apóstolo Paulo que tinha como objectivo levar o evangelho até aos confins do mundo do seu tempo, a Espanha, e o zelo de São Francisco Xavier, que levou o evangelho até ao fim das suas forças às portas da China, onde faleceu.

Ásia, nova fronteira da Missão
Passaram dois mil anos depois de Cristo nos ter enviado pelo mundo inteiro, a anunciar o evangelho a toda a criatura; e se bem que evangelizamos a Africa e a América, a maior parte das pessoas da Ásia, o continente mais extenso deste planeta, ainda não foi exposta à luz de Cristo. Estamos longe de poder dizer missão cumprida, pelo que, mãos à obra, não podemos cruzar os braços.

Fiz-me judeu com os judeus, para ganhar os judeus; (…) com os que estão sujeitos à Lei, comportei-me como se estivesse sujeito à Lei (…) com os que vivem sem a Lei, fiz-me como um sem Lei (…) para ganhar os que vivem sem a Lei. (…) Fiz-me tudo para todos, para salvar alguns a qualquer custo. E tudo faço por causa do Evangelho. 1.ª Coríntios 9, 20-23

Na Ásia, especialmente no Japão e na China, mas também na Índia a Igreja não soube imitar o grande apostolo Paulo, que conseguiu purgar o Cristianismo do judaísmo fazendo-o mais credível para os gentios do seu tempo.

O Jesuíta Mateo Ricci foi um verdadeiro seguidor de São Paulo no seu esforço de purgar o Evangelho da cultura ocidental para o versar na cultura chinesa. Mas como outrora, no tempo de São Paulo, os fundamentalistas da comunidade de Jerusalém tentaram obstaculizar o seu esforço de inculturação do evangelho na cultura greco-romana, mas não foram bem-sucedidos, os de Roma no tempo de Mateo Ricci fizeram o mesmo e por desgraça, foram bem-sucedidos.

Eis aqui o nosso calcanhar de Aquiles. Foi fácil a Missão na América, porque ante uma cultura primitiva, um pouco pela espada, outro pouco pela cruz, o evangelho foi mais imposto que proposto. Na Africa, a Missão triunfou porque ia de mãos dadas com o progresso material: escolas, clínicas, luta contra a fome etc… nos tempos da fome na Etiópia, a Igreja Ortodoxa Copta chegou a acusar-nos de comprarmos prosélitos com farinha.

Na Ásia embatemos contra uma cultura diferente, em nada inferior à nossa, e não tivemos nem a valentia de São Paulo, para inculturar o cristianismo no mundo pagão do seu tempo, nem a sabedoria dos padres da Igreja, para inculturar o cristianismo na cultura superior greco-romana que reinava na Europa do tempo.

Ainda estamos a tempo de fazer da Igreja mais universal, quanto à diversidade de culturas, e não esperar que o mundo se vá ocidentalizando cada vez mais.

Como dizia o maior teólogo do século passado, Karl Rahner, Deus na sua infinita misericórdia salvará todos aqueles que, sem culpa própria, não tiveram a oportunidade de conhecer a Cristo e o seu evangelho; mas salvar-nos-emos nós, que tínhamos o dever de lho anunciar?
Pe. Jorge Amaro, IMC