22 de novembro de 2012

"Átrio dos Gentios"

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O Vaticano criou, um espaço para o diálogo entre crentes e não crentes, denominado “Pátio dos Gentios”. Este nome evoca o único lugar do templo de Jerusalém que podia ser frequentado por não judeus. Era, de facto, o local onde se compravam e vendiam os animais para os sacrifícios.

O Templo de Jerusalém estava dividido em átrios, que consistiam em rectângulos concêntricos, dispostos em função do nível “Sagrado”: desde o menos sagrado, o Pátio dos Gentios aberto a toda a gente, até ao mais sagrado, o Sancta Sanctorum. Seguindo esta escala, no primeiro entraria qualquer pessoa, no segundo só entrariam Judeus, no terceiro Varões, no quarto Sacerdotes e no quinto, unicamente, o “Santo dos Santos”, o Sumo-sacerdote.

Em concreto, o diálogo entre crentes e não crentes, ocorrido em Guimarães e Braga nos passados dias 16 e 17 de Novembro encheu-me as medidas; designá-lo “Átrio dos Gentios” faz sem dúvida sentido em termos históricos e metafóricos, mas não está imune à possibilidade de uma certa conotação pejorativa.

“Gentios” era o nome depreciativo que os Judeus davam aos não Judeus, havendo, até, Fariseus que, veementemente, acreditavam que Deus criou os gentios para alimentar o fogo do inferno (local onde iriam parar os “maus” Judeus). Nesta óptica, considero que, nos dias de hoje, chamar “gentios” aos “não crentes” é como chamar-lhes “infiéis”, nome que os muçulmanos dão a todos os que não professam a sua fé.

Quando eramos pequenos, se havia coisa que mais odiássemos era que os chamassem nomes; devemos evitar a tentação de apelidar os outros desde e em função da nossa cosmovisão – forma de ver e estar no mundo. Por esta mesma razão os Inuit do Norte do Canadá não gostam que lhes chamem Esquimós; esse é o nome que nós lhes damos não o nome com o qual se identificam. Duvido que os não crentes em geral ou os que simplesmente não professam a nossa fé, gostem de ser chamados “gentios”.

Sobre este monte, o Senhor do Universo há-de preparar para todos os povos um banquete de manjares suculentos, um banquete de vinhos deliciosos. Isaías 25,6

Se tivesse que encontrar no Antigo Testamento um nome metafórico para este espaço de diálogo entre homens e mulheres de boa vontade, eu chamar-lhe-ia o Banquete de Isaías. Isaías é, sem duvida, o profeta menos nacionalista e o profeta mais universalista do Judaísmo, um autêntico “cristão” avant la letre.
Pe. Jorge Amaro, IMC

9 de novembro de 2012

Aldeia das Religiões - The Golden Rule

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Para promover a tolerância e o diálogo inter-religioso, visando o fim das “guerras santas” e a paz no mundo, realizou-se na aldeia de Priscos, Braga, entre os dias 25 e 28 de Outubro, a segunda Aldeia das Religiões (a primeira foi realizada no Brasil, em 1992).

“Não faças aos outros aquilo que não queres que te façam a ti” é a versão mais conhecida de uma regra que um missionário canadiano baptizou como sendo a regra de ouro porque, com poucas variações, existe em todas as religiões do nosso planeta. Cito algumas:
  • Hinduísmo - Este é o supremo dever: não faças aos outros o que poderia causar dor se te fosse feito a ti. Mahabharata 5: 1517
  • Budismo – No tratamento dos outros não uses maneiras que seriam dolorosas para ti. O Buda, Udana-Varga 5.1
  • Confucionismo - Uma palavra que resume a base de toda a boa conduta: bondade. Não faças aos outros o que não queres que te façam a ti mesmo.  Confúcio Analectos 15:23
  • Judaísmo - O que é odioso para ti, não o faças ao teu vizinho. Esta é a toda a Torá; tudo o resto é comentário. Vai e aprende-a. Rabino Hillel Talmud, 31
  • Islão - Não te consideres crente enquanto não desejares aos outros o que desejas para ti. Profeta Muhammad, 13 de Hadiths 40 de Nawawi
  • Cristianismo - Em tudo, faz aos outros, o que desejarias que os outros te fizessem a ti; esta é toda a lei e profetas. Mateus 7:12

Formulando a regra de ouro pela negativa estas religiões só nos dizem o que devemos evitar; enquanto o cristianismo na sua formulação positiva diz-nos o que devemos fazer. Apesar da formulação muçulmana ser também positiva (o que pode dever-se à inegável influência cristã nesta religião, que nasceu 600 anos depois de Cristo), esta expressa um desejo e não comanda uma ação. Não ultrapassa por isso o nível das boas intenções…

O que me faz bom não é o meu esforço para evitar o mal mas, sim, o meu esforço para fazer o bem. Enquanto as formulações negativas e a expressão de um desejo deixam-me no “dolce fare niente”, a formulação cristã, o mandamento de Cristo, tira-me da minha passividade, da minha inércia, da minha preguiça ou da minha zona de conforto, fazendo de mim um ativista pela justiça e pela paz.
Pe. Jorge Amaro, IMC